Subi ao terraço mais alto da Cidade, quase sala de cima da velha Jerusalém, o do Convento de São de Salvador, minha casa desde que cheguei. Aurora ainda, as nuvens baixas inflamadas entre alaranjado e rosa, dentro de muros um silêncio já claro, silêncio de altar, a oriente, já iluminado ostensório, o Monte das Oliveiras, e emergindo lento e solene sobre ele da noite, como cósmica hóstia luz e ouro, o sol nascente, vindo donde Domingo, entre ramos e alegria, viéramos, porque o Senhor, triunfante, por aí viera, entrando em Jerusalém para a Páscoa.
A paz deste momento inicial foi prelúdio de um dia impossível de dizer.
Basílica do Santo Sepulcro, às oito horas, entrada do Patriarca trazido pela Custódia da Terra Santa. Começa a Celebração que reúne numa única a Missa Crismal e a Missa da Ceia do Senhor, logo pela manhã, estranha situação. O Tríduo será todo assim. Amanhã, logo pela manhã, celebraremos a Morte do Senhor e no dia seguinte, logo pela manhã, celebraremos a Vigília Pascal, roubando à Páscoa a espera expectante do sábado.
Porquê? A história de Deus connosco continua a ser a de sempre, uma história de paradoxal sujeição Sua aos nossos limites, quadratura impossível, água e terra e fogo e ar, da plenitude do círculo que só a loucura divina alcança; aqui os limites têm um nome que até no dizer-se incorrectamente diz como seria desejável crescer dele, o Statu Quo. É este documento que espartilha a celebração do Tríduo Pascal na Cidade da Páscoa. E este ano, pela primeira vez, o Tríduo Pascal é celebrado com um ritual, aprovado por Roma com carácter definitivo, de acordo com o espírito da Reforma Litúrgica. Vale a pena contar: o chamado Statu Quo foi imposto pelo Império Otomano às Igrejas da Basílica do Santo Sepulcro, também de Belém e do Túmulo da Virgem, em 1852, consagrando a situação que vigorava desde 1767. Ao longo dos séculos, nunca foi possível separar a vida deste Santuário dos acontecimentos da história mundial, dos interesses da Europa colonizadora nomeadamente e da consequente instabilidade política que a Cidade de Jerusalém sempre conheceu. Os Estados imiscuíram-se frequentemente, por iniciativa própria ou a pedido das Igrejas, muitas vezes ao serviço de interesses estratégicos das potências.
Formalmente, na Basílica do Santo Sepulcro estão, para além da Igreja Católica Romana, a Igreja Ortodoxa Grega e os Arménios e também os Coptas e os Siríacos. As disputas, nomeadamente territoriais entre elas na Basílica, foram uma constante, particularmente entre católicos e gregos nos séculos XVII e XVIII. O Statu Quo determina muitos aspectos: a posse dos espaços na Basílica, o horário e a duração das celebrações, o itinerário das procissões e como se devem fazer, o uso de incenso, de velas, as leituras e o canto. Para a Igreja Católica isto significou ter de cingir o Tríduo Pascal às linhas de uma prática litúrgica muito antiga, impossibilitada de adaptações e de toda a evolução litúrgica que se registou entretanto. Já desde 1955, com o Papa Pio XII, quando mudou o modo católico de celebrar a Páscoa que mudanças eram procuradas no Santo Sepulcro, mas só em Outubro de 2011, ao fim de um longo percurso, foi aprovado o novo Ritual, já em experiência desde fins da última década do século passado.
Hoje, logo de manhã, aqui, celebramos a Ceia do Senhor à hora da Missa Crismal, juntando ao Lava-pés a renovação das promessas sacerdotais, a consagração do santo Crisma e a bênção dos Óleos dos Catecúmenos e dos Enfermos. Longa Liturgia da Palavra, que muitas eram as faces do Mistério a contemplar. O Patriarca trouxe a história até à Entrada do Sepulcro: «Nós somos prisioneiros do ódio, da desconfiança e do medo entre os homens», diz, em nome do seu povo que habita a própria Cidade Santa, os Territórios da Autoridade Palestiniana, Israel, a Jordânia e Chipre; continuou: «para nós que vivemos sobre esta Terra Santa, Cristo continua a sofre nos membros do seu corpo místico; nós que somos confrontados cada dia com a falta de liberdade e paz, com o vexame, os sofrimentos e mesmo o martírio. Estas condições de vida ferem-nos no mais profundo da nossa alma. Nós temos tanta fome e sede de justiça e de paz; nós só sonhamos levar uma vida normal».
Após, a veemência do Bispo ainda a ecoar na Anastásis, o gesto maior do contraponto divino à história do homens, a parábola do Lava-pés, o modo joanino de dizer a instituição da Eucaristia. Filhos de Francisco, guardiães desta Terra, descalçam as sandálias que palmilham estes lugares desde que Francisco aqui veio, na sua cruzada alternativa de 1219, e o Patriarca, servo, inclina-se diante de cada um dos doze e a água corre da jarra sobre os pés nus. Anormal mas ideal, este horizonte para renovarmos as promessas sacerdotais, as duas centenas de presbíteros que estávamos, experiência única esta de o fazer aqui, colocando o Acto nas mãos do Patriarca da Igreja-Mãe Jerusalém, donde Pedro partiu para Roma; aqui, diante do Sepulcro Santo aberto a ilustrar maximamente o sentido oculto, como no segredo a passagem da Morte à Vida que só ele viu, dinamismo pascal de passagem que a consagração do Crisma das unções sacerdotais, proféticas e reais, tal como, antes, a bênção do óleo dos já a viver o risco-de-vida na doença ou os ainda a preparar-se para a vida-outra dos filhos de Deus, os catecúmenos, que aqui encontra o seu lugar originante, naquela porta aberta na edícula do Sepulcro: todos lá nascemos, como narra a longa evocação da história da salvação para a consagração do Crisma a atravessar permanentemente as portas antigas dos muros de Jerusalém, a criação, o dilúvio, pomba e ramo de oliveira, Moisés e Aarão, o sacerdote, David, o rei e, na aurora, João, o Baptista, profeta, até chegar, definitiva travessia, à Entrada do Sepulcro aqui.
E a Eucaristia, aqui, a Anáfora I, os sacrifícios de Abel e Melquisedeque, a Virgem Mãe e José seu esposo, os apóstolos e tantos mártires, aqui, per ipsum et cum ipso et in ipso, Cidade-altar. E, de novo, o apelo da ressurreição, incenso, muito incenso, a Rotunda a fazer-se itinerário circular, luz entre as mãos. Três voltas redondas, que a quadratura é humana, mas Deus circular plenitude, a última volta a alargar-se à Pedra da Unção, o Patriarca, chegado ao peito, entre as mãos, as mesmas que haviam lavado pés, o Corpo Eucarístico; e as palavras antigas quase como as portas da velha Cidade, mas não tanto, porque cantam já a chegada da nova Jerusalém, Lauda Sion Salvatorem, Pange língua glorioso corporis mysterium, Adoro Te devote latens Deitas. Incenso, outra vez muito incenso diante da Presença, a elevar-se aos três patamares de galerias da cúpula, como as palavras que chamam os sentidos à reverência, Tantum ergo Sacramentum. Santíssimo colocado no Sepulcro, envolvido em flores, damascos, linhos e velas e silêncio adorante, silêncio que fica… que as portas da Basílica continuam cerradas após a Celebração, a Basílica hoje exclusivamente dos latinos, como aqui são chamados os católicos.
Não é a presença de Cristo que, aqui, é mais real. É Cristo que, aqui, é mais realidade.
Foi o dia inteiro a comprová-lo.
Princípio da tarde, no Convento de São Salvador, o Vigário Custodial acolhe cordialmente os representante das Famílias Nusseibeih e Joudneh, muçulmanos que há séculos são os detentores da Chave da Única Porta da Basílica do Santo Sepulcro, emparedadas as outras existentes. Neste dia, vêm à Custódia, numa visita simbólica após a qual o Vigário, com alguns franciscanos mais, com a chave na mão, única vez em cada ano, desce até à Basílica, onde a devolve, para que a Porta seja solenemente aberta, com o complexo cerimonial deste dia.
Pouco depois, no Santo Sepulcro, Ofício Divino e adoração eucarística, o Senhor num belíssimo Tabernáculo de prata octangular, como se estivesse guardado pelas bem-aventuranças, só que estas são ouro, o ouro dos podres, pode dizer-se a pensar na inversão do mundo de amanhã.
Princípio da tarde também, peregrinação ao Cenáculo, onde só duas vezes por ano, hoje e Pentecostes, se pode vir celebrar, ouvimos: o nosso Salvador aqui celebrou a Ceia pascal instituindo o memorial da sua Páscoa, aqui lavou os pés aos apóstolos e deu o Mandamento Novo, três momentos de um ritual todo simplicidade, adolescentes da paróquia de Jerusalém crismados no próximo Pentecostes, que também aqui aconteceu, tal como as aparições após a ressurreição, de pé nu para a agua pelas mãos do Custódio da Terra Santa, numa Sala de Cima apinhada de gente de todas as nações, um calor intenso, as guitarras dos seminaristas franciscanos a sustentar as vozes no louvor, única acto da alma aqui possível.
A peregrinação continua, cidade além, que os franciscanos visitam cada ano neste dia duas comunidades irmãs com quem os sobressaltos da história no Cenáculo estreitou a relação: em 1551, expulsos deste Lugar santo, são acolhidos pelos Arménios – a visita é à sua Catedral de São Tiago Maior, aqui decapitado segundo a Tradição, edificada sobre o palácio de Caifás, onde Jesus foi julgado pelos sacerdotes e negado por aquele a quem entregou o primado; após a destruição de Saladino, quem ficou a viver nas ruinas do Cenáculo, mantendo viva a memória, foram os Siríacos Ortodoxos, visita seguinte.
As ruas de Jerusalém a pejar-se progressivamente de gente, gente e mais gente, são romaria quente e no silêncio temperado da Basílica do Santo Sepulcro, nas entranhas do mundo, pousado sobre o Lugar onde esteve o Corpo Morto e donde se ergueu, Ressuscitado, está o Corpo Eucarístico e oferece-se-lhe a Adoração, radical e total convergência nEle.
À noite, a Igreja das Nações, assim de diz de Getsemani, foi-o. Não cabia mais ninguém quando o Custódio, depois de beijar a Pedra da Agonia, aqui, aturou sobre ela, gestos de semeador, pétalas de rosa cor de sangue. E ouvimos a Palavra, em sete línguas –o evangelho cantado em árabe, língua que para dizer Deus diz Ala, assemelha-se estranhamente ao canto do convite à oração que, cinco vezes por dia chama os muçulmanos à oração – contar a predição da negação de Pedro, depois a Agonia de Jesus no Horto, depois a sua Prisão. A Pedra foi incensada, muitos ficaram em oração pela noite dentro, outros juntaram-se aos muitos que estavam cá fora e partimos pela noite fora em procissão de velas da paróquia de Jerusalém, tudo dito e cantado em árabe, a lembrar também estranhamente o aramaico que ouvimos na Paixão de Mel Gibson e a sentirmo-nos ainda mais aqui por essa semelhança; o nosso destino, atravessado o Vale da torrente do Cédron, a Igreja erguida sobre as lágrimas de Pedro, no lugar, aqui, em que, segundo a Tradição, o Apóstolo chorou a sua Traição.
Ao regressar, na sala de cima da manhã, o Terraço de São Salvador, a luz da noite era intensa, a lua quase cheia, quase redonda a lembrar a adoração que decorria, sob aquelas cúpulas que brilhavam, quase ao alcance da mão, as que cobrem o Lugares da Morte e Ressurreição do Senhor, aqui.
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